terça-feira, 10 de maio de 2016

INSTABILIDADE?

Às vezes eu tenho a impressão de que os políticos estão se divertindo com os termos que utilizam, ao aplicar certas palavras indicando coisas contrárias ao que originalmente aquele vocabulário significaria. Além das conhecidas exaltações à liberdade, à constituição, à democracia e a condenação veemente da corrupção de um único partido, a palavra da vez parece ser “instabilidade”. Por conta da revogação da votação do impeachment na Câmara, um senador disse que o governo e seus aliados só estão querendo gerar mais instabilidade ao país.

É sério que eles acham que agir conforme as leis é causar instabilidade? Os golpistas parecem crianças. Já sabemos que desde a eleição de 2014 são crianças que não sabem perder. Mas, para além das posições políticas, me surpreende a ingenuidade desse povo que acha que tirar o PT do governo acabará com todos os males sociais e tudo que pretende dificultar o processo é motivo de pirraça. Se a Dilma indica o Lula como ministro, não pode é ilegal e fez isso para ter foro privilegiado. Se acusam o golpe, dizem que o impeachment está na constituição. Se indicam ilegalidades no processo querem causar tumulto.

O fato é que o golpe não dá direito de defesa. O cordeiro deve ser levado a sacrifício sem se manifestar ou tentar evitar o holocausto. Ou melhor, monta-se um teatro de legalidade, para dizer que a vítima teve direito de defesa. Mas, como disse José Eduardo Cardozo, essa é uma prática golpista, pois as cartas já estão marcadas e tudo se resume a mera encenação. Relatores que entregam pareceres substanciosos de um dia pro outro, proibições de palavras, crimes que não conseguem ser explicados. Com ares de processo democrático e amparados pela constituição inventam um impeachment sem crime de responsabilidade. Aqueles que não conseguiram vencer nas urnas por 4 vezes só podem obter o poder através de um golpe.

Mas sério que acham que esse é o caminho mais correto para fazer o país enfrentar a crise e devolver a estabilidade. Rasgaram a constituição e 54 milhões de votos. Se a partir de 2015 a crise econômica nos atingiu em cheio, a oposição vez de tudo para que não conseguíssemos sair dela. Conjuntamente, fomentaram uma crise política que deixou o país ingovernável. A solução que apresentam é retirar uma presidenta não acusada de corrupção para colocar no lugar os maiores envolvidos e políticas de austeridade.

Se querem estabilidade, se preparem pois não terão. A palavra “golpista” estará sempre gravada nas testas dos deputados e senadores que votaram a favor do impeachment. Além do mais, o povo que negou nas 4 últimas eleições o projeto neoliberal que a tal “ponte para o futuro” defende não vai aceitar facilmente. Vai ter golpe, e vai ter luta. Pelos direitos trabalhistas, em defesa da Petrobrás, da educação e saúde pública, as ruas serão ocupadas, certamente.

Aí, o que restará aos golpistas é dar o toque “militar” do golpe. Com a polícia oprimindo e rechaçando qualquer tipo de manifestação. A sonhada estabilidade se mostrará, na verdade, o início de uma guerra civil. E a culpa não estará necessariamente em nenhum dos lados, mas na imprensa que destilou o ódio e esqueceu qualquer tentativa de imparcialidade, no judiciário que passou em cima de leis e preceitos constitucionais, da polícia e suas conduções coercitivas sem convite para depor, dos políticos que, em busca de seus interesses pessoais, cagaram para o país, dos empresários (sobretudo a FIESP) que ampararam a ilegalidade para tornar legal a falta de direitos. Mas, sobretudo, do Superior Tribunal Federal, que é a instituição pela qual esperávamos que ordenasse a bagunça e dissesse a justiça.

As arbitrariedades que o STF realizou ou deixou de realizar nos levou até aqui. A instabilidade social está no horizonte. Nem um governo golpista terá legitimidade para governar em paz. Ignoradas a constituição e a democracia, qualquer escolha se mostra frágil. O que entristece e desaponta é ver que pouco se caminhou de 88 para cá. Não conseguimos criar instituições fortes e democráticas que julguem de forma imparcial e democrática. E onde a lei não é o rei, só nos resta a escravidão e as relações personalistas. Falhamos, sobretudo, em criar uma “cultura democrática”. 

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