Falemos sério: a questão de fato nunca
foi a corrupção, mas o projeto de poder que ela sustenta. Se aqueles que pedem
o impeachment e querem tirar o PT do governo estivessem realmente preocupados
com a corrupção estariam ao menos incomodados com o processo ser conduzido pelo
Eduardo Cunha, pelo fato de o governo ser assumido pelo PMDB. Ficariam
indignados com o sigilo imposto sobre a lista da Odebrecht, com o afinco de
investigar o Lula enquanto escândalos envolvendo outros partidos e políticos
são rapidamente abafados.
Esse discurso do “somos contra a
corrupção, queremos que ambos os lados sejam investigados e presos” é
falacioso. Não porque o princípio esteja errado, ou mesmo seja antiético. Para
uma democracia fortalecida precisamos disso e de que ninguém esteja acima das
leis. No entanto, não é o que acontece na prática. A honrada ideia não deixa de
ser isso, uma ideia. Não quero hierarquizar um partido mais ou menos corrupto,
mas é, no mínimo, de se desconfiar a parcialidade da mídia e do judiciário
brasileiro. O foco massivo em apenas um lado da moeda fortalece os discursos
que colocam um único partido como origem e consequência da corrupção.
Todavia, não é possível alegar
ingenuidade daqueles que querem o impeachment para acabar com a corrupção. Pois
dessa forma não concordariam com a cena burlesca daquela votação na câmara no
dia 17. Ou seja, não é corrupção que incomoda, mas o que se faz com ela. Os
golpistas querem o poder, não para acabar com corruptos e corruptores, mas para
terem de volta o controle da PF, a promulgação de impostos, da escolha de
ministros para o STF etc.
O argumento é que se deve acabar com o
governo petista porque devido à corrupção ele desenvolveu uma maquinaria que
lhe permitisse ficar indefinidamente no poder. Os desvios do dinheiro público
seriam para isso: vencer as eleições. É isso que os “arautos da ética” dizem
defender. No entanto, não é isso que faz do PT um governo que, apesar de todas
as denúncias e perseguições, seja ainda uma opção menos pior do que todo o
resto entre os outros partidos de centro-direita.
Se a corrupção é ubíqua, não escolhendo
lados e partidos, e dificilmente será exterminada, devemos nos questionar o que
de fato ela nos auxilia. O que é melhor, a corrupção que sustenta um projeto de
governo que beneficia a muitos ou a poucos? Será que ela é mais justa nas
contas bancárias no exterior de uns poucos políticos ou em melhorias e prazeres
privados do que aquela que sustenta no Estado pessoas que prezam a melhoria do
público e o maior acesso à saúde e educação a todos?
Os defensores da moral e dos bons
costumes querem realmente o fim da corrupção ou querem a volta de uma estrutura
que trazia benefício unicamente a corruptos? Querem retornar ao poder para
destruir o bem público em benefício próprio. Não interessa se suas atitudes vão
prejudicar o país, o que interessa é o quanto podem receber de empresas em suas
contas. Querem a distinção. A isso criticam os médicos cubanos que se submetem
a ir a áreas pobres acabando com o glamour daquela profissão. Querem o pré-sal.
Dane-se a soberania nacional, dane-se a saúde e educação, dane-se o SUS e a
escola pública. Essas coisas não dão dinheiro. Ao contrário, quanto menos
investimento, menos impostos e mais distintos são aqueles que podem pagar por
serviços exclusivos.
A isso, vê-se que a corrupção não é o
problema. Se fosse, ainda sim preferiria um projeto que beneficiasse a maior
parte da população e não apenas poucos, corruptos ou aqueles que querem manter
seus privilégios. Aqueles que dizem querer seu país de volta, querem recuperar
uma estrutura de poder que mantinha uma sociedade desigual e obediente a seus
superiores. Falar em corrupção é só um bode-expiatório para ocultar as reais
intenções e justificar o golpe, pois ninguém dúvida que aqueles deputados que
votaram contra corrupção votaram em benefício próprio, de sua família, esposa, filhos,
net...
Nenhum comentário:
Postar um comentário