domingo, 3 de abril de 2016

OS FINS JUSTIFICAM OS MEIOS?

Talvez, o primeiro a responder positivamente a essa questão tenha sido Maquiavel, no início do século XVI, em sua obra O Príncipe. Propondo uma cisão entre ética e política, em que o governante deveria fazer o que fosse preciso para manter o poder, mesmo que isso significasse ir pelo caminho contrário ao sugerido pelos preceitos morais, deixou horrorizada uma Europa cristã, em que, ao contrário, o príncipe deveria ser justamente um símile e condutor dos princípios religiosos. Tal argumentação certamente foi um dos elementos que propiciou as bases para a percepção pejorativa que o termo maquiavélico tem, ainda hoje, entre nós.

Apesar da resistência sofrida por essa concepção, ninguém duvida de sua vitória. Mesmo que ainda fiquemos horrorizados com uma política sem ética, hoje a ação política determinada por preceitos morais e religiosos já não é tão desejada. Inclusive até preferimos que o privado seja afastado do público, e que opiniões particulares fiquem distantes dos assuntos sociais. Tem sempre um parlamentar querendo intervir no sexo, no útero, na roupa, na educação alheia etc. e essa distinção entre âmbitos é o que, na verdade, nos resguarda. No entanto, há um fator que deveria estar acima de qualquer opção pessoal: o bem-comum.

Ao contrário, o que percebemos é a atuação de grupos midiáticos, jurídicos, industriais, sociais etc, querendo destruir conquistas políticas tardias, em nome de escusos interesses privados. Não admira que aqueles que querem o Impeachment da presidenta, sejam justamente aqueles mais denunciados por corrupção. Não é de se surpreender com as estatísticas de que a maior parte dos que vestem verde-amarelo ganhem mais, tenham nível superior, votaram no Aécio etc. Em resumo, são pessoas que veem uma piora em suas condições de vida, isso, todavia, devido à melhora da vida dos outros. Para esses que sempre tiveram privilégios, a busca por igualdade significa opressão e um governo mais preocupado com as questões sociais só pode parecer uma ditadura.

Em verdade, querem a destruição desse projeto de Brasil a qualquer custo. Querem o fim das garantias trabalhistas, o monopólio midiático, a privatização dos bens públicos, o silêncio das diferenças, os privilégios, a distinção da massa da população e, por conta dessa tal pretensa superioridade, a submissão. E nesse sentido: os fins justificam os meios? Ao que parece, sim. Mas não de um governante que quer sustentar seu Estado, ao contrário, de uma elite ávida por reconquistar o poder perdido. Identificam a perda desse mundo com o PT, o ex-presidente Lula, a presidenta Dilma, os movimentos sociais com a figura do mal e estão dispostas a tudo para ter seu país de volta!

Não interessa a opinião dos outros. A democracia só vale se minha opção prevaleça. As pessoas se admiram com a presença e participação ativa da população nas manifestações do dia 18 e 31, contra o golpe e a favor da democracia. Sim, gente, não sei se vocês sabem mas a Dilma ganhou as eleições e há 54 milhões de pessoas dispostas a defender sua escolha. Certamente, os golpistas acharam que seria mais fácil derrubar a presidenta, para terminar as investigações e vender o Brasil. Para se atingir o objetivo tudo seria permitido, até ignorar os meios.

Vivemos na exceção. Começando pela perseguição voraz a um único partido e a ocultação de toda corrupção realizada por outros. Para isso, não é necessário respeitar o comprometimento jornalístico, a constituição, a ética médica, a opinião dos outros.  Corruptos unidos prometem combater a corrupção. Decreta-se a prisão preventiva ou a tal condução coercitiva antes mesmo de uma séria investigação ou da pessoa ser notificada a depor. Afinal, nestes casos, geralmente o acusado já foi determinado, agora só falta o crime, mas esse é irrelevante.

Por esse pensamento, quem usa vermelho não é patriota, mesmo que seja contra a desigualdade social e a favor do investimento público. De verdade mesmo é a FIESP, que pede impeachment e colori seu prédio de verde-amarelo, o fato dela defender a terceirização e o desmonte da CLT é só um detalhe e favorece aquele Brasil pelo qual acredita valer a pena. A médica que negou atendimento a uma mãe petista é louvada pelo presidente de seu sindicato. A OAB protocola um pedido de impeachment tentando criminalizar absurdamente ações legais. Ainda bem que ela é uma organização isenta, mesmo não sendo tão rápida assim para pedir a cassação de Eduardo Cunha e ter apoiado o golpe de 1964.

Justiça? Já ouvi falar. Nesta ditadura petista em que só petista é preso, a informação e a investigação é totalmente parcial. Enquanto pedem a prisão preventiva de Lula, para orgasmo da elite e para espetacularização da mídia, por um triplex e um sítio que nem é dele, Cunha e sua família estão soltos. Mas cassá-lo ou prendê-lo pode atrapalhar o andamento do processo de impeachment e inimigo do meu inimigo é meu amigo. Observam o parecer de Gilmar Mendes como o ícone da justiça e da idoneidade. Quem não te conhece que te compre. Por isso defendo a discussão política em termos de intenção, não de verdade. O bem público, o comportamento ético, justo e comprometido não interessa, desde que os fins sejam obtidos. Mesmo que para isso seja necessário espoliar a população, agir contra a constituição, levantar a voz, usar de violência e ignorar a legitimidade das urnas, levando junto todos pilares que sustentam nossa democracia.

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